terça-feira, 23 de junho de 2009

Diário do Araguaia

O jornal Estado de S. Paulo publica uma série de matérias com revelações extraídas de relatório assinado por Sebastião Curió, hoje militar da reserva, um dos líderes da repressão à Guerrilha do Araguaia. A revelação mais impactante até agora é que os militares executavam os guerrilheiros já dominados e presos e não em combate.

Revelação porque está escrito, documentado. Até agora os dados oficiais sobre a guerrilha, ocorrida na década de 70, permanecem secretos. Nem Fernando Henrique nem Lula tiveram coragem suficiente para enfrentar as Forças Armadas e abrir os arquivos. Mas as famílias dos mortos na região norte do país têm, a muito tempo, certeza sobre a execução de grande parte dos militantes. Depoimentos de sobreviventes e de moradores da região já haviam reconstruído cenas de terror.

Lembro de Clóvis Petit, irmão de Maria Lúcia Petit, a única que teve os restos mortais reconhecidos e entregues à família, na cerimônia em homenagem à irmã, realizada em Bauru na década de 90. Chorando, ele descrevia a cena da jovem comunista dominada e executada por militares super-armados.

A Guerrilha do Araguaia é responsável pelo surgimento de uma das personagens mais emocionantes da história brasileira: a costureira Julieta Petit, que esperou, em Bauru, a volta dos três filhos.

Mulher simples, criada na região, onde teve seus cinco filhos, Julieta não sabia onde Lúcio, Maria Lúcia e Jaime estavam. Depois da anistia, esperou a volta. Acreditava que os filhos estavam livres para circular normalmente e rever a mãe. Todos os exilados voltaram, os três não. Não estavam exilados, estavam mortos. Só então ela soube o que acontecera e virou símbolo de outra luta: o resgate dos corpos e a entrega aos familiares, para o enterro.

Julieta teve a saga reconhecida e homenageada, foi indenizada, mas conseguiu enterrar apenas Maria Lúcia. Morreu sem ter a chance de encontrar os outros dois. A velha senhora está enterrada em Bauru, no mesmo túmulo da filha. É para onde vão Lúcio e Jaime, caso o governo brasileiro um dia resolva de fato revelar onde estão os restos mortais que precisam ser devolvidas às famílias.

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